quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Meu Pai aos 100 anos

 

Fátima Farias


           Como seria meu Pai aos 100 anos de idade?  Como iríamos comemorar esta data tão especial, caso estivesse fisicamente conosco?
         Vamos recuar na janela do tempo!
 Era 18 de novembro de 1916 quando a alegria tomou conta do lar do casal Joaquim e Elvira (Pai Quinca e Mãe Viu), com o nascimento de Inácio, aquele que mais tarde seria meu amado Pai, meu ídolo e tesouro. Há três anos, o lar já tinha Ana ou Naninha (Titia). Como primogênita e única mulher amava seus cinco irmãos como se fora uma mãe. 
Meu Pai aprendeu bem a lição. Especialista em amar a família, o fez de tal maneira que não limitava a quantidade de filhas às suas ‘Três Marias’ (seríamos quatro, mas a primogênita nasceu morta), costumando computar os sete netos no mesmo patamar de igualdade e ostentava, orgulhosamente, como um troféu ‘meus dez filhos’, considerados suas ‘jóias raras’.  Para compor esta frondosa árvore casou-se com minha mãe, Lecy, sua prima.
Quando os primeiros filhos ainda eram crianças, meu avô adquiriu a Fazenda Navalha,  que passou a ser o recanto paradisíaco dos Pereira de Farias. Na frente da casa grande, a imponente Baraúna, sob todos os pontos de vista, virou símbolo secular do clã e uma referência dos nossos ancestrais. Lá estão os açudes, tanques naturais, flores do campo, os pés de umbus, o cheirinho do curral e do leite tirado na hora, resistindo às felizes lembranças de um tempo, presente apenas na imaginação e saudades.
Acredito que seria neste cenário especial que a família passaria o dia comemorando o seu centenário. A julgar pelas características genéticas, meu pai ainda hoje seria um homem forte, do ponto de vista físico, muito lúcido, paparicaria os três bisnetos, reeditando as brincadeiras criadas para os netos. Ao chegar à Capital completaria o programa sentindo a brisa leve da praia, de preferência a do Cabo Branco, quem sabe almoçando no Mag Shopping, numa mesa com visão privilegiada para vislumbrar o mar, que ele tanto gostava.
Eita, o sonho acabou!
Quando meu Pai partiu para o plano espiritual, apesar da convicção da imortalidade da alma, fiquei sem chão e compreendi a observação de Artur da Távola, de que “a perda do pai é a retirada da rede protetora no momento do salto”. A maior herança deixada por ele foi manifestada no velório: testemunhos espontâneos que ouvimos, destacando sua probidade incontestável, o que ecoou nos nossos ouvidos como uma música serena para afagar nossa dor. Morro de orgulho desta herança moral.
E assim, há vinte anos não o vejo nem o abraço, mas como é doce lembrar a convivência com ele!  O privilégio em comemorar a data ficou seus pais e  irmãos, lá no outro plano. Tanto que o último irmão, Joaquim, que estava neste planeta, partiu exatamente oito dias antes! Foi juntar-se ao meu pai Inácio, à Titia, Euclides, Bibi, José e Antônio - este, o caçula, partiu primeiro. Minha mãe foi encontrá-lo faz cinco anos.
A nós, seus descendentes,  só nos resta enviar as nossas vibrações e preces de amor, emanadas do fundo do nosso coração. Sempre agradecendo a Deus, o Pai maravilhoso que tive e pelo grande exemplo de amor e dignidade que plantastes em nossos corações.
Até o nosso reencontro, meu amado Pai, meu anjo, meu eterno tesouro!! Feliz aniversário!!



terça-feira, 14 de junho de 2016

Matemática do tempo e da saudade


                                                                              Fátima Farias




          A frieza dos números pode expressar, também, a extensão de uma imensa Saudade. Dia 19 de junho de 2016  completa exatos 20 anos, 7.300 dias e aproximadamente 175.200 horas que vi e toquei meu amado e idolatrado pai, pela última vez.
Haja tempo decorrido!
Tão distante a presença física, mas ainda tão próxima lembrança daquela fria manhã de Outono, em que me senti sem chão. E as palavras de Artur da Távola a confirmar e ecoar: “a perda do pai é como a retirada da rede de proteção, no momento da queda”. E aí vem o refúgio na convicção da nossa transitoriedade terrestre e imortalidade da alma, que permitem a nossa infinita sintonia. A certeza do futuro reencontro me consola. Tudo é questão do tempo de cada um. Um dia a gente se reencontra, sim, meu amado pai. Isso é um conforto! 
Quantas coisas acontecem em 20 anos!
         Meu pai gostava de ler jornais e revistas, para se atualizar dos acontecimentos.  E assim já se passaram duas décadas e inúmeros fatos aconteceram, pelo mundo afora: bons e ruins. Países em conflitos, terrorismo, violência, o nosso Brasil num caos político, imagem comprometida, mergulhado em corrupção e crises: econômica e moral. Diante disso, aí que sinto orgulho de suas lições de honestidade, dignidade, por meio de exemplos. E, nos seus dias finais, recomendando aos netos para “nunca querer nada de ninguém”. Quando escuto alguém dizer que gostaria ter um pai como o de alguém, com todo respeito aos pais de cada um, meu coração vibra e agradece porque tive o privilégio de ter o melhor pai do mundo. Seus valores eram tão grandiosos que ofuscava qualquer imperfeição inerente a nós, seres humanos.
         Mas continuando as notícias, meu pai, com a partida do Papa João Paulo II, chegou Bento XVI, que renunciou, e, pela primeira vez na história mundial, temos dois papas vivos. Assumiu o argentino Papa Francisco, que vem encantando o Mundo, com sua assertividade, carisma, espírito ecumênico, ao quebrar paradigmas, com sua humildade e jeito simples de ser. Um detalhe interessante é que o brasileiro ignorou sua nacionalidade, neutralizou a rivalidade, e gosta dele como se fôra um dos nossos patrícios. 
       O Brasil conquistou o Pentacampeonato Mundial, em 2002. Continuamos liderando, mas a última Copa, sediada no Brasil, nos encheu de vergonha. Perdemos por 7 a 1 da Alemanha, que fisgou o tetra em 2014.
As redes sociais, meu pai, vêm tomando conta do mundo e escanteando, aos poucos, a mídia impressa. Hoje, o Oriente e Ocidente estão conectados, em tempo real, num simples acesso ao aparelho celular. Este também substituindo a ida aos bancos para fazer operações diversas. As crianças dão um show de sabedoria no manuseio virtual. Parece até que já nascem com um chip, sabendo de tudo.
Meu pai não alcançou Boa Vista virar cidade e crescer. Algumas vezes visitei a Fazenda Navalha e, como sempre, choro de emoção ao reencontrar, em cada recanto aprazível, a energia positiva dos nossos ancestrais, em especial a da sua geração. Quantas Saudades! Sempre que vislumbro o mar, lembro-me do Senhor. Aliás, a praia do Cabo Branco continua linda e energética!
Novidade cultural: ousei estrear no mundo da literatura, publiquei o livro "Encontro com Consciências - Diálogo da unidade com a diversidade", e, lógico, dediquei ao Senhor. Mas, antes de mim, sua filha e minha irmã Socorro, enveredou na literatura, lançando dois livros de Genealogia: "Abrindo o Baú de Aninha" e "Memórias guardadas no Baú de Aninha"
A melhor notícia de todas é que nossa família cresceu e fomos presenteados, até agora, com seus três bisnetos: Alisson, Gabriel e Miguel, nossos tesourinhos.
Mas quantas coisas acontecem em duas décadas!
Neste ínterim, há cinco anos, minha mãe partiu ao seu encontro, aumentando nossas doses de saudades. Agora temos dois anjos para velar por nós.
         Concluo reafirmando os infinitos “quilômetros” de saudades que nos separam, até um dia do nosso reencontro.  Mas, por enquanto, meu pai, emanando apenas sentimentos positivos, desejo-lhe evolução espiritual plena, paz e luz! Te amo imensa e eternamente, meu tesouro!




Meu pai amava vislumbrar o mar. Herdei dele esta atração

PARTIDA E CHEGADA
Autor desconhecido

Quando observamos, na praia, um veleiro a afastar-se da costa, navegando mar a dentro, impelido pela brisa matinal, estamos diante de um espetáculo de beleza rara.  O barco, impulsionado pela força dos ventos, vai ganhando o mar azul e nos parece cada vez menor. 
Não demora muito e só podemos contemplar um pequeno ponto branco na linha remota e indecisa, onde o mar e o céu se encontram. 
Quem observa o veleiro sumir na linha do horizonte, certamente exclamará: "já se foi". 
Terá sumido? Evaporado?  Não, certamente. Apenas o perdemos de vista. O barco continua do mesmo tamanho e com a mesma capacidade que tinha quando estava próximo de nós. Continua tão capaz quanto antes de levar ao porto de destino as cargas recebidas. 
O veleiro não evaporou, apenas não o podemos mais ver. 
Mas ele continua o mesmo.  “E talvez, no exato instante em que alguém diz: já se foi”, haverá outras vozes, mais além, a afirmar: "lá vem o veleiro".  Assim é a morte. 
Quando o veleiro parte, levando a preciosa carga de um amor que nos foi caro, e o vemos sumir na linha que separa o visível do invisível dizemos: "já se foi".  Terá sumido? Evaporado?  Não, certamente. Apenas o perdemos de vista.  O ser que amamos continua o mesmo. Sua capacidade mental não se perdeu.  Suas conquistas seguem intactas, da mesma forma que quando estava ao nosso lado. 
Conserva o mesmo afeto que nutria por nós. Nada se perde a não ser o corpo físico de que não mais necessita no outro lado. 
E é assim que, no mesmo instante em que dizemos: já se foi”, no mais além, outro alguém dirá feliz: "já está chegando". 
Chegou ao destino levando consigo as aquisições feitas durante a viagem terrena.  A vida jamais se interrompe nem oferece mudanças espetaculares, pois a natureza não dá saltos.  Cada um leva sua carga de vícios e virtudes, de afetos e desafetos, até que se resolva por desfazer-se do que julgar desnecessário. 
A vida é feita de partidas e chegadas. De idas e vindas.  Assim, o que para uns parece ser a partida, para outros é a chegada
Um dia partimos do mundo espiritual na direção do mundo físico; noutro partimos daqui para o espiritual, num constante ir e vir, como viajores da imortalidade que somos todos nós.

                  (Há quem atribua o texto acima ao espírito Victor Hugo)